Land grabbing, flex crops e reestruturação do setor de florestas plantadas no Brasil

Resumo: O debate sobre 'land grabbing' tem mobilizado diversos pesquisadores e especialistas das mais variadas áreas da Ciência, desde que começou a ser notado um aumento exponencial de aquisições de terras agrícolas e de extração mineral, sobretudo depois da crise financeiria de 2008. Fundos de pensão e de investimento e empresas estatais despontaram como interessados em adquirir largas porções de terras em países dos continentes africano, sulamericano e asiático.
Essa 'corrida mundial por terras' vem sendo compreendida como resposta de países, empresas e fundos de investimento à perspectiva de crise em diversos sentidos: crise alimentar, crise ambiental e crise financeira. Ressalta-se, porém, uma dimensão financeira desses investimentos, constituindo novidades num 'setor' historicamente avesso à imobilização de capitais. No entanto, à busca por energias alternativas (ou energias ditas 'verdes') para 'limpar' as matrizes energéticas de empresas e países soma-se o intuito de diversificar o portfolio de carteiras e fundos de investimentos e também conferir aparência de materialidade e solidez ao capital financeiro.
As chamadas 'flex crops' podem ser compreendidas como 'lavouras de destinação variável'. Trata-se da busca por melhoramentos genéticos e articulação tecnológica na fase de processamento de matérias-primas que permitam que a agroindústria tenha a flexibilidade de dar usos diferentes para uma mesma produção agrícola, podendo se adaptar às variações de condições instáveis de mercado. As 'flex crops' surgem, portanto, como estratégia produtiva atrelada à dinâmica de 'land grabbing' e da financeirização, uma vez que permitem mobilizar diferentes mercados e readequar a oferta agroindustrial conforme a conjuntura, permitindo inclusive especular nos mercados futuros de maneira mais flexível.
Os proponentes desse projeto têm conduzido diversas pesquisas sobre o fenômeno do 'land grabbing' em termos teóricos e em suas particularidades, sobretudo para o Brasil. O caráter coletivo da equipe de pesquisa e a experiência nas temáticas em questão devem ser, pois, ressaltados.
Visando o aprofundamento de reflexões relacionadas à modernização da agricultura e à constituição e reprodução crítica do agronegócio no Brasil, propomos aqui uma pesquisa sobre a reestruturação fundiária, produtiva e, portanto, das relações de trabalho, particularmente relacionadas ao setor de florestas plantadas. Para tanto, pretendemos investigar o caso de cinco processos hoje em curso no centro e norte do Espírito Santo, na Zona da Mata nordestina e no interior de São Paulo:
1. A crise da Aracruz Celulose, seus motivos e efeitos subsequentes, incluindo as estratégias de alavancagem que culminaram na sua quase falência, sua aquisição pelo Grupo Votorantim com participação do BNDESPar, gerando a Fibria, e, por fim, a fusão entre ela e a Suzano Papel e Celulose que deu origem à formação da gigante Suzano S/A e ampliou a produção de florestas plantadas na porção centro e norte do Espírito Santo, mediante mudanças nas suas estratégias de apropriação fundiária, envolvendo aquisições, fornecedores e arrendamentos.
Localização: município de Aracruz (unidade fabril), Linhares, Santa Tereza, Santa Leopoldina e Conceição da Barra (terras próprias, fornecedores e arrendamentos), no Espírito Santo.
2. A substituição da cana-de-açúcar por eucalipto em terras de encosta pela Usina Petribú S/A em Pernambuco para o abastecimento das termelétricas. Iniciada em 2015 com o plantio em 3.000 ha, dos quais 1.000 ha foram plantados em terras de fornecedores a previsão era de que alcançasse os 18.000 ha com plantações de florestas até 2020, de modo a conseguir gerar, até 2021, 400 megawatts de energia elétrica. No momento em que a previsão foi feita, a usina contava com uma planta com capacidade para gerar 69 megawatts.
Localização: município Lagoa de Itaenga (sede) e municípios adjacentes (área total 10.000 ha), em Pernambuco.
3. A formação de uma joint venture entre a Duratex Florestal, subsidiária da Duratex S/A que tem capital aberto e ações negociadas pela BM&FBOVESPA, e a Usina Caeté, que pertence ao grupo Carlos Lyra, em 2014, para a produção de 6.000 ha de eucalipto e a instalação de uma unidade fabril da Duratex S/A para a produção de painéis em MDF e MDP em Alagoas prevista para 2019. Os primeiros 4.000 ha com florestas plantadas foram implantados para possibilitar o contrato de joint venture que deu origem a razão social Caetex Florestal S/A, cuja duração será de 39 anos. A expansão do plantio chegou aos 6.000 ha em terras da própria Usina Caeté e foi estimada para alcançar os 13.500 em terras que seriam arrendadas até 2019. A implantação da unidade fabril foi contemplada com a isenção fiscal pelo Programa de Desenvolvimento Integrado (Prodesin) e contou com financiamento do BNDES no valor de R$ 25.459.126 milhões destinados a ampliação dos plantios.
Localização: BR-101, próxima ao porto de Maceió (unidade fabril, terras próprias e arrendamentos), em Alagoas.
4. A recuperação judicial sofrida pelo grupo paulista Energias Renováveis do Brasil (ERB) nos investimentos realizados em Alagoas. O grupo chegou em 2012 com um projeto que previa o uso do eucalipto como biomassa para a produção de energia e a instalação de um polo moveleiro. Desde então veio arrendando inúmeras propriedades para a implantação de florestas plantadas. Acontece que o financiamento do projeto não foi aprovado da maneira como planejado e um dos sócios do grupo, o Banco português Espírito Santo, justo o que tinha um braço que atuava na área de energia retirou os investimentos desse setor. Ocorreu então o rompimento dos contratos e teve início a recuperação judicial.
Localização: municípios de Viçosa, Capela e Atalaia (arrendamentos), em Alagoas.
5. A história de consolidação da Suzano Papel e Celulose no interior de São Paulo e sua expansão nos anos 2000, constituindo um dos maiores conglomerados do agronegócio brasileiro e a comparação da produção de florestas para o seu processamento agroindustrial e a recente estratégia do agronegócio paulista de adquirir áreas de florestas no Vale do Ribeira, para a compensação por danos ambientais em outras áreas do estado.
Localização: municípios de Registro e Iguape (Vale do Ribeira) e Araraquara, Limeira, Lençóis Paulista e Itapetininga
Estes processos serão estudados por duas sub-equipes de pesquisas. A primeira será coordenada pelo Prof. Dr. Cássio A. Boechat, proponente deste projeto, e se centrará nos estudos dos casos 1 e 5, tendo como foco os estados do Espírito Santo e de São Paulo, articulados entre si pela proeminência do papel da Suzano S/A em ambos os contextos. A segunda sub-equipe será coordenada pela Profa. Dra. Ana Carolina Gonçalves Leite e enfatizará a análise dos casos 2, 3, e 4, nos estados de Pernambuco e Alagoas. Estas etapas da pesquisa, conduzidas pela segunda sub-equipe, já foi contemplada em Edital Humanidades, para fomento à pesquisa em Pernambuco e está iniciando as suas atividades. A articulação entre as sub-equipes, além da temática comum e da trajetória semelhante de seus participantes compartilhando metodologias de pesquisas e perspectivas teóricas, será feita por encontros regulares para discussão de bibliografias selecionadas e para o debate sobre os andamentos da pesquisa.
Com isso, além da relevância da temática ressaltamos a importância da consolidação e reforço de uma extensa rede de pesquisadores, debruçados sobre processos de land grabbing e flex crops, ora pensados particularmente para o setor de florestas plantadas.

Data de início: 10/06/2021
Prazo (meses): 36

Participantes:

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